Lidar com um morador que está inadimplente gera uma série de dúvidas, especialmente para aqueles que estão administrando o problema. Por isso, na hora de aplicar sanções e penalidades, muitos se sentem pisando em ovos, sem saber o que deve ou não ser feito e como agir de acordo com a Lei, sem prejudicar o condômino e, ao mesmo tempo, sem trazer rombos para os cofres.
Não é à toa que, nesse ínterim, é muito comum que uma questão se sobressaia: “Será que a água e a luz podem ser cortadas?”. Entenda o que está previsto:
Apesar de o art. 1.336 do Código Civil afirmar que os condôminos têm como dever contribuir para as despesas de acordo com as suas frações, isso não é sinônimo de uma exigibilidade.
Partindo de um ponto de vista humano, tanto a água quanto o gás são necessários para que os indivíduos possam sobreviver e isso é respaldado pelo artigo 10, I da Lei 7.783/89, que afirma que o tratamento e abastecimento de água, assim como a produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis são considerados serviços essenciais.
Inclusive, cortar esses itens viola o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, expresso no artigo 1.º, inciso III, da Constituição Federal. Afinal, não é digno impedir que alguém tome banho, prepare sua comida ou até mesmo possa despejar seus dejetos, uma vez que tudo isso pode acarretar prejuízos graves e irreparáveis para seu psicológico e moral.
Além disso, o Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 22, também ratifica o posicionamento, entendendo que “os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos”.
Com isso, de acordo com a Lei 8.987/95, a interrupção do fornecimento em razão de inadimplemento só pode ser levada a efeito pelas concessionárias de serviço público responsáveis, não cabendo à administração do condomínio realizar essa função.
Dessa forma, é possível compreender que essa atitude de realizar o corte é ilegal por inúmeras razões e não apenas pelo direito fundamental que todo cidadão tem de utilizar esses itens, mas também porque há um amparo legal que garante esse direito ao consumidor.
Em 2010, o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou parcialmente uma ação civil entendendo que o corte de fornecimento era ilegal, visto que a sanção havia sido executada pelo condomínio e não pela prestadora de serviços. Ainda assim, o inadimplente teve que pagar o que devia e não teve direito à indenização por danos morais, considerando que não era lícito onerar novamente quem já havia custeado a cota do condômino devedor.
Em 2018, no Rio Grande do Sul, foi decidido, porém, que o condomínio possui meios legais de realizar a cobrança das cotas e que a penalização com os cortes não era um deles, abrindo o leque para compreender que, apesar de tudo que já foi visto e julgado, essa é uma medida polêmica e que ainda levanta uma série de debates em seu entorno.
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